1 de março de 2011

PAIXÃO

"De deseo somos

La vida, sin nombre, sin memoria, estaba sola. Tenía manos, pero no tenía a quién tocar. Tenía boca, pero no tenía con quién hablar. La vida era una, y siendo una era ninguna.
Entonces el deseo disparó su arco. Y la flecha del deseo partió la vida al medio, y la vida fue dos.
Los dos se encontraron y se rieron. Les daba risa verse, y tocar-se también."
Eduardo Galeano

A paixão é o preço que pagamos por sermos desejantes.
Quase todas as pessoas no mundo ocidental desejam apaixonar-se, pois acreditam que somente o amor romântico pode trazer a felicidade. Esta idéia está presente na literatura, músicas, novelas, filmes, propagandas e outras tantas mensagens da mídia.
Apaixonar-se é mágico, nos enche de entusiasmo! É um sentimento agradável.
Mas é ilusão, miragem. Formulamos opiniões sobre outra pessoa que não se baseiam na realidade e sim na necessidade emocional de completude.
Isso acontece porque todos nós precisamos reencontrar aquele estado perfeito de simbiose e satisfação absoluta que experimentamos enquanto bebês, antes do nascimento e logo depois dele durante os cuidados maternos. Mais tarde, a vida em sociedade trata de nos impor seus limites e restrições, os “nãos” constantes, os condicionamentos. E, como uma defesa, ocorrem as idealizações, fantasias e projeções que nos remetem àquele estado original de prazer permanente.
A projeção é um recurso inconsciente que nos permite viver, através do outro, nossas próprias potencialidades. Enaltecemos no outro características que gostaríamos de ter ou que de fato temos guardadas e não sabemos. Em suma, o outro é um espelho onde nos vemos refletidos.
John Money, sexólogo, afirma que todos desenvolvemos um “mapa amoroso”, entre os 5 ou 6 anos de idade, ou até antes, baseados nas relações familiares e experiências sociais. Na adolescência, os mapas tornam-se mais precisos quanto a tipo físico, caráter etc, formando um quadro mental do parceiro idealizado. Ocorre que muitas dessas características são determinadas por aspectos inconscientes de nosso psiquismo e por isso não entendemos quando nos sentimos tão atraídos por “essa pessoa” e não por “aquela”. Ou seja, somos encantados por algum aspecto do outro que satisfaz uma exigência de nosso inconsciente. 
Segundo Helen Fisher, antropóloga e especialista em paixão, as pessoas são mais suscetíveis a se apaixonarem quando estão mais vulneráveis. Crises no casamento, perdas, traições, auto-estima rebaixada são situações de fragilidade emocional propícias ao aparecimento de uma nova paixão. Ela considera que a paixão é como um vício. Altera a química do cérebro, como ocorre no uso de opiáceos ou estimulantes. Estudos científicos apontam que as tomografias do cérebro do indivíduo apaixonado são muito parecidas com as tomografias do viciado em cocaína.
Avassalador o desejo. Mudanças de humor. Melancolia. Euforia. O tempo custa a passar. Os dias são intermináveis, os instantes incontáveis, tal a ansiedade que nos devora por dentro. Calafrios, pupilas dilatadas, boca sem palavras, o cheiro do outro que embriaga, o coração disparado. Distração. Pensamentos que correm em círculos. Obsessão. Sacrificamos tudo e corremos todos os riscos em nome desse sentimento.
Essa excitação temporária, que pode durar apenas uma semana, ou até chegar a três ou quatro anos, fica por conta de um estado sublime, a sensação de finalmente termos encontrado naquela pessoa uma parte de nós que estava faltando e que agora nos é devolvida e nos faz inteiros.
Por isso, quando acaba (e sempre acaba) ficamos vazios. A paixão pode se transformar gradativamente em um amor mais maduro e estável ou pode ficar em seu lugar somente amizade, mas o fato é que quando acaba fica uma sensação de que fomos ludibriados. Perdemos o chão. De repente, não mais nos reconhecemos.
Acordamos, enfim, do sonho de completude que tínhamos projetado em alguém, à medida que a convivência e a intimidade tratam de nos mostrar a realidade. O amor verdadeiro, acreditem, não tem nada de cego!

3 comentários:

  1. Parabéns, Ana pelo post. Sempre bom refletir sobre essas tão impactantes emoções humanas que nos fazem bem e mal. Degraus de evolução no caminho. Tenha um ótimo dia.CHICO FORLENZA

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  2. Que bom que retomou o blog. Adoro ler as coisas que você escreve de maneira a nos fazer deslizar pelo texto. Não sei bem como explicar. Sei que gosto. E muito!
    Bom ter suas palavras enquanto descubro minhas paixões, me decepciono, volto a acreditar, desacredito, e vou indo na minha caminhada. Meio às avessas como Benjamin Bunton (como você disse um dia...), mas, do meu jeito, indo bem e feliz.
    Beijos, tia querida!
    Amo você!

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  3. Que bom ter você aqui de novo, minha amiga. Me sinto mais próximo de você quando a leio.
    Amo você - isso a distância jamais conseguirá alterar.

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