29 de abril de 2009

Fragmentos de um discurso amoroso V – seu aniversário


Antes de te encontrar, todos os dias te esperei.
Esperei pelo beijo em frente à estação. Esperei pelo sorriso de menino. Esperei que me perguntasse se havia lugar em meu castelo. Esperei que entrasse, que ficasse. Esperei que me desejasse, porque “de desejo somos” diz Galeano. E que me mostrasse uma perspectiva, uma avenida, uma ave, como no poema de Maiakovski. Esperei pela utopia. E pela ternura, e pela vontade forte de mudar o mundo.
Eu já sabia que juntos ouviríamos o mar, caminharíamos no deserto, abraçaríamos árvores, correríamos em campos de girassóis, contemplaríamos o por do sol, contaríamos estrelas, passearíamos de mãos dadas entre os edifícios das cidades de pedra, amaríamos pessoas, faríamos amor e filhos, plantaríamos flores, colheríamos conchas, riríamos das imperfeições e nos divertiríamos fazendo tudo de novo... mais novo, mais poesia, mais imperfeito, mais longe...
E de olhos fechados o criei em meu mundo. E coloquei nossos retratos na parede. E guardei suas memórias e histórias. E o vi dormindo na rede, como índio, sonhando comigo. E fiz minhas suas palavras, e ouvi o som do sim, música bonita, infinita...
Então hoje, quando acordei, olhei para o relógio e ele parecia se mover ao contrário, trocando de tempo e de idéias, como se me dissesse que o absurdo da existência é chegar ao fim. E que este presente não acaba nunca.

26 de abril de 2009

Chuva



Tarde de sábado, Campo Grande. Fico no carro enquanto meus amigos atravessam a rua pra comprar incenso. É preciso perfumar a casa. Chove muito. Essa água toda caindo do céu, lavando os vidros do carro, um choro da natureza.

É triste. É uma tarde triste. E não ligo que seja triste. Tenho vontade de me molhar, de sair na chuva, parar de me preocupar e aceitar, me entregar no que tiver que ser, sem grandes sofrimentos.
Dá vontade de nem ligar pra imperfeição. De não me preocupar mais com as “lágrimas de diamante”, e deixar o mundo chorar à vontade, e deixar meu coração seguir livre o seu vazio, e me atirar nesse oco pra ver onde vai dar, e fazer isso não por coragem, mas por medo, pra finalmente desmistificar o medo.
Acho que é uma atitude corajosa enfrentar nossos medos de frente, desarmados. Isso eu tenho que fazer agora, não posso adiar, porque se tiver medo de me machucar, se paralisar agora, vou me acostumar ao que não gosto. E isso não é justo, porque a vida é pra ser vivida com gosto, com prazer e desejo de ter ainda mais.

Meus amigos entram no carro, vamos ao supermercado. Enquanto fazemos as compras, penso que ter amigos é uma parte maravilhosa da vida. Que bom saber que no caminho sempre se cruza gente boa. O que seria de mim se não pudesse desfrutar desses simples momentos cotidianos? Ou o que seria se não fizesse reflexões entre as prateleiras de um supermercado?
A vida deve ser assim, uma história bacana. Eu quero escrever uma história bacana. Porque, como me lembra sempre uma grande amiga, “não sou nenhuma vagabunda pra viver de qualquer jeito, viu meu bem!” E, no final da história, quero encontrar a Ana, quero voltar pra casa e deixar a porta aberta pra que ela entre e me conte mais sobre a vida.