16 de junho de 2009

Fragmentos de um discurso amoroso VII - TE ENGAVETEI


Te engavetei. Do verbo engavetar, meter em gaveta. Na intimidade da palavra: do latim "gabata", tigela, escudela. Em português passou a designar a caixa sem tampa que enfiamos nas mesas. Em sentido metafórico, é um dos sinônimos para prostituta. A frequência com que uma gaveta é aberta e fechada lembraria o ofício da profissional do sexo. Mas nesta gaveta - esta na qual te engavetei, onde te guardo com o passado - não há mais tempo para sexo, para abrir e fechar as pernas, para fechar os olhos e gozar. Esta gaveta eu tranquei. E a chave... joguei fora. Te encerrei no arquivo de ferro, no baú, na geladeira, na mala, no cofre, na mesa do escritório, no guarda-roupa, na caixa-preta. O tempo flui. Não faz sentido investigar os registros do último vôo. Prossigo novamente, nova mente, mãos vazias, sem lágrimas.

15 de junho de 2009

Fragmentos de um discurso amoroso VI - NÃO GOSTO DE SINAL FECHADO


Eu não gosto de sinal fechado. Eu quero chegar antes. Não corro, ando devagar seguindo as pegadas da utopia. Peço licença.
Eu não gosto do teu “senão”, das condições do teu tempo, das tuas previsões.
Eu não gosto dos dias nublados nem das tuas cores. Prefiro as manhãs douradas. Prefiro as noites quentes.
Eu não conheço tua língua, teus planos, tua lógica.
Não trafego no teu curso.
Desprezo tuas mentiras. Brinco com tuas verdades. Não creio nos teus planos.
Não entendo teus sinais, não escuto bem tua voz. O que você disse mesmo? O que?
Ouço ruídos que vêm de dentro.
Ouço aquela música e a minha voz.
Não preciso de lentes de aumento. Meus monstros são grandes. Meus medos me apavoram. Meus fantasmas me assustam no fim do corredor. E por isso não gosto do escuro.
Contemplo meus sonhos à meia luz. Abro as janelas pra lua entrar.
Não tenho nada a esclarecer.
Não vejo tudo de você.
Não sei dos outros.
Pergunto de mim.
Não sei onde é o começo, nunca cheguei ao fim.

Eu não gosto de sinal fechado.